POLÍTICA DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO: UMA
AVALIAÇÃO DA GESTÃO DO SISTEMA DE PROTEÇÃO À PROPRIEDADE INTELECTUAL NO BRASIL
Dr.José
Matias-Pereira
Universidade de Brasilia (UNB)- Brazil
E-mail: matias@unb.br
Submission: 04/10/2011
Accept: 15/11/2011
Este artigo tem como objetivo avaliar o nível de
desempenho da gestão do sistema de proteção à propriedade intelectual no
Brasil, em particular o registro de patentes e marcas. A análise teve como base o arcabouço institucional do país na área objeto
do estudo: Lei de Propriedade Industrial, de 1996; as diretrizes de Política
Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior, de 2004; a Lei de Inovação
Tecnológica, de 2004; a Lei do Bem, de 2005; a Política de Desenvolvimento
Produtivo, de 2008; o Plano de Ação de Ciência, Tecnologia e Inovação para o
Desenvolvimento Nacional – 2007/2010. O exame dos aperfeiçoamentos que foram
introduzidos no arcabouço institucional do Brasil nos últimos anos e as
melhorias que provocaram na gestão das políticas públicas de proteção à
propriedade intelectual revelou que ainda existem sérias dificuldades na
implementação e gestão dessas políticas, em particular no segmento de registro
de marcas e patentes.
Palavras-chave: ciência, tecnologia & inovação; política industrial
e tecnológica; propriedade intelectual; marcas e patentes; desenvolvimento
econômico; Brasil.
1. Introdução
A análise dos indicadores que tratam da evolução da
economia mundial nas três últimas décadas revela uma forte correlação entre o
crescimento da concorrência e os investimentos em ciência, tecnologia e
inovação. Esse cenário sinaliza que a priorização de investimentos em ciência, tecnologia e
inovação (C,T&I) é essencial para permitir que um país alcance um nível
adequado de desenvolvimento sustentável, evitando, dessa forma, utilizar-se da
exploração predatória de seus recursos naturais ou humanos para elevar sua
competitividade (UNESCO, 2010).1
A inovação, nesse contexto, se apresenta como um
tema permanente e estratégico para as empresas, considerando que é a partir da
capacidade de transformar idéias em valor, agregar tecnologias e oferecer
produtos de qualidade que a indústria de um país torna-se competitiva. Esse novo perfil irá
permitir que as empresas conquistem novos mercados, e como decorrência, irão
gerar empregos.
Pode-se argumentar, nesse sentido, que a utilização
intensiva da ciência e tecnologia e inovação numa economia, conforme evidencia
a literatura, permite a elevação da capacidade de competir, criando
empreendimentos, empresas, empregos e marcas comerciais. Essa estratégia, por sua vez, tende a aumentar a interação entre política
industrial e tecnológica e propriedade intelectual (MATIAS-PEREIRA;
KRUGLIANSKAS, 2005). Nesse sentido, a gestão das políticas públicas de proteção
à propriedade intelectual se apresenta como um instrumento importante para
apoiar o crescimento econômico do país. Por sua vez, quando existem deficiências
na gestão das políticas na área de proteção à propriedade intelectual, seus
efeitos tendem a afetar a competitividade das empresas.
Os relatórios e discurso governamental sustentam
que nos últimos seis anos a área de C,T&I passou a ser uma questão de Estado;
o foco na política de C,T&I foi orientado para os eixos estratégicos; foi
definido novos marcos regulatórios; criados novos instrumentos e formatos de
financiamento e aperfeiçoamento da gestão dos fundos setoriais; bem como um
aumento dos recursos federais para C,T&I. Apesar desses avanços, partimos
do pressuposto que os resultados alcançados pelo Brasil, desde a criação dos
fundos setoriais, da Lei de Inovação Tecnológica e da Lei do Bem, no que se
refere aos resultados de registro de patentes brasileiras, não são
satisfatórios.
É sabido que existem diversas maneiras de reduzir
os possíveis custos da extensão do nível de abrangência das patentes. Entre elas destacamos
duas opções: a primeira se refere ao emprego de
mecanismos de abusos do poder econômico; a segunda trata da criação de
ambientes institucionais que estimulem a atividade de investimentos em pesquisa
e desenvolvimento por empresas que operam nesses setores por meio da necessária
articulação entre governo-iniciativa privada-universidade. Entendemos que o
Brasil, a partir de um efetivo esforço para melhorar a gestão do sistema de
políticas de proteção à propriedade intelectual, deveria orientar-se para a
segunda opção.
Diante desse contexto, torna-se possível formular a
seguinte pergunta: a gestão do sistema de proteção à propriedade intelectual no
Brasil é consistente?
Este
artigo tem como objetivo avaliar o nível de desempenho da gestão do sistema de
proteção à propriedade intelectual no Brasil, em particular o registro de
patentes. Usamos como referências o
estudo de Guimarães, Políticas de inovação: financiamento e incentivos, de
2006; a Lei de Propriedade Industrial, Lei nº 9.279/1996 (denominada Código da
Propriedade Industrial); as diretrizes de Política Industrial, Tecnológica e de
Comércio Exterior, de 2004; a Lei de Inovação Tecnológica (Lei nº 10.973, 2004
- Decreto
nº 5.563, de 2005); a Lei do Bem (Lei nº
11.196/2005 - Decreto nº 5.798/2006);2 o
Plano de Ação de Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Nacional
– 2007/2010; e a Política de Desenvolvimento Produtivo, de 2008.
No Brasil cabe ao Estado desenvolver uma política
para promoção da inovação com vistas ao progresso nacional, em cumprimento ao
que dispõe o art. 219 da Constituição Federal que disciplina que: "O
mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a
viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico,
o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei
federal". De maneira
específica, os direitos de
propriedade intelectual no Brasil, em nível constitucional, estão definidos
no art. 5º, XXVII, XXVIII e XXIX, da Constituição Federal de 1988.
No Brasil, na área da propriedade industrial, está
em vigor a Lei n° 9.279, de 14 de maio de 1996 (Lei da Propriedade Industrial),
que disciplina as questões relativas à propriedade industrial no Brasil, no
qual estão incluídas: marca, desenho industrial, segredo industrial, indicação
geográfica e patente. Por sua
vez, a Lei de Inovação
Tecnológica, Lei nº 10.973, de 02 de dezembro de 2004, que estabelece medidas
de inventivo à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente
produtivo, com vistas à capacitação e ao alcance da autonomia tecnológica e ao
desenvolvimento industrial do País, foi aprovada para atender os termos
definidos nos artigos 218 e 219 da Constituição
Federal de 1988. A referida Lei foi regulamentada pelo Decreto nº 5.563, de 11 de outubro
de 2005.
Tendo como propósito, também, o incentivo ao
desenvolvimento científico e tecnológico do país, foi promulgada a Lei nº
11.196, de 21 de novembro de 2005, denominada Lei do Bem, que estabelece os
mecanismos para desonerar os investimentos realizados em projetos de inovação,
bem como o Decreto nº 5.798, de 08 de junho de 2006, que regulamenta os
incentivos fiscais à inovação.
A Lei do Bem tem como foco todas as empresas que
atuam com foco na inovação, com intuito de conceder incentivos fiscais, tais
como: deduções de Imposto de Renda e da Contribuição sobre o Lucro Líquido -
CSLL de dispêndios efetuados em atividades de P&D; a redução do Imposto
sobre Produtos Industrializados - IPI na compra de máquinas e equipamentos para
P&D; depreciação acelerada desses bens; amortização acelerada de bens
intangíveis; redução do Imposto de Renda retido na fonte incidente sobre
remessa ao exterior resultantes de Contratos de Transferência de Tecnologia; e
isenção do Imposto de Renda retido na fonte nas remessas efetuadas para o
exterior destinada ao registro e manutenção de marcas, patentes e cultivares. Entretanto, como parte dos incentivos é destinada ao
abatimento de Imposto de Renda e Contribuição Social sobre o Lucro, as empresas
que optam pelo chamado Lucro Real, e não pelo Lucro presumido ou Simples
Nacional, são as maiores beneficiadas (ARAÚJO et. al, 2010).
Registre-se que as 21 prioridades definidas no
Plano de Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Nacional - Plano
de Ação 2007/2010 - estão diretamente relacionadas com os quatro eixos
estratégicos que norteiam a atual Política Nacional de C, T&I: expandir,
integrar, modernizar e consolidar o Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia e
Inovação (SNCTI), atuando em articulação com os governos estaduais para ampliar
a base científica e tecnológica nacional; atuar de maneira decisiva para
acelerar o desenvolvimento de um ambiente favorável à inovação nas empresas,
fortalecendo a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (Pitce); fortalecer as atividades de pesquisa e inovação em
áreas estratégicas para a soberania do país, em especial energia, aeroespacial,
segurança pública, defesa nacional e Amazônia; e promover a popularização e o
ensino de ciências, a universalização do acesso aos bens gerados pela ciência,
e a difusão de tecnologias para a melhoria das condições de vida da população. Está prevista no Plano a aplicação de R$ 41
bilhões para o período de 2007/2010. Assim, o Plano procura expressar a
configuração da nova Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação,
orientado para estimular o desenvolvimento econômico e social do país (BRASIL/
MCT, 2007).
Em termos metodológico este é um artigo
teórico-empírico e exploratório, qualitativo e bibliográfico. Realizamos, também, com vista a aumentar o seu nível de
consistência da pesquisa, uma pesquisa não estruturada (de profundidade) com
especialistas no tema. É relevante destacar, diante da amplitude e complexidade
do tema, que não temos a pretensão de esgotar o assunto objeto deste estudo.
Dinâmica do crescimento e processo
de industrialização
A relevância do progresso tecnológico tem sido
retratada teórica e empiricamente há várias décadas, com destaque para a
contribuição de Joseph Schumpeter (1982), que nas
primeiras décadas do século XX demonstrou a importância do processo de inovação
para o crescimento do produto. Na década
de 1950, Robert Solow (1988) criou as bases para a construção da teoria do
crescimento econômico. No primeiro estudo, desenvolveu um modelo teórico que
sustenta o fato de que sem progresso tecnológico não há crescimento sustentado
do produto per capita (SOLOW, 1956). Para o país alcançar o progresso
duradouro, é necessário que se permita que a economia possa agregar algo à
produção, sem necessariamente acrescentar mais mão de obra e capital. Solow
denominou essa fonte de riqueza de "progresso tecnológico". No
segundo artigo, buscou demonstrar, num exercício empírico, que o progresso
tecnológico foi o maior responsável pelo crescimento da economia
norte-americana (SOLOW, 1957). Registre-se, entretanto, que aquele teórico não
conseguiu explicar o que levava ao progresso tecnológico. Coube a Paul Romer
(1986, 1987, 1990 e 1993), na segunda metade da década de 1980, propor nova
abordagem na teoria econômica sobre o desenvolvimento. Nesses estudos seminais
sobre a teoria do crescimento econômico, incorporou a inovação tecnológica, ou
seja, a produção de idéias, como o principal impulsionador do crescimento. Por
sua vez, Warsh (2006) sustenta que Romer ampliou o campo de percepção da
ciência econômica para capturar um mundo - a economia do conhecimento –
expressa até então de forma muito vaga.
Para a compreensão de fenômenos associados à
mudança econômica nos apoiamos na teoria evolucionária (NELSON; WINTER, 1982,
2005). Para essa
linha de pensamento, são as competências dos agentes
econômicos que determinam seu comportamento, tendo como parâmetro uma
racionalidade que é limitada. Na perspectiva evolucionária, o capitalismo é
dominado essencialmente pela mudança econômica resultante do impacto do
processo de inovação (ROSENBERG, 1994). Inovação baseada no progresso técnico,
o qual, segundo Dosi (1988), é fator determinante para a competitividade
internacional.
Invenções e inovações tecnológicas
e propriedade intelectual
As invenções e inovações tecnológicas, ao longo da
história, sempre foram vistas com certa reserva e desconfiança pela humanidade.
Observa-se, entretanto, que
essas resistências tendiam a desaparecer quando as
pessoas começavam a perceber vantagens materiais, econômicas ou militares nas
novas idéias.3 Verifica-se
que prêmios e estímulos por parte dos governos, bem como gastos de indivíduos
com pesquisas aplicadas, tornaram-se uma constante. Nos últimos 60 anos foi
sendo implementada nos países mais evoluídos, de forma cada vez mais
consistente, a aplicação do conhecimento científico para fomentar o
desenvolvimento tecnológico e a inovação. As atividades de P&D seriam,
então, o iniciador e o indicador fundamental da inovação.Verifica-se, no campo
da propriedade intelectual, que ocorreram mudanças significativas a partir do
começo da década de 1980. As empresas multinacionais, a partir daquela
penúltima década do século XX, intensificam suas estratégias de globalização do
mercado. Isso foi responsável pelo aumento dos gastos em investimentos de
pesquisa e desenvolvimento (P&D) em setores relacionados às novas
tecnologias. A internacionalização dos mercados passa a exigir tanto a
liberalização dos fluxos de mercadorias, serviços e capitais, por um lado, como
um nível mais elevado de harmonização nas normas que definem o ambiente
institucional no âmbito da concorrência, com destaque para o sistema de
propriedade industrial. Com o aumento da participação dos gastos em
investimentos de pesquisa e desenvolvimento nos novos produtos, as patentes
passam a representar um fator importante no cálculo de taxa de rentabilidade
privada do investimento. A tecnologia, dessa forma, torna-se um fator
primordial na quantificação das vantagens comparativas nos mercados mundiais.
Assim, a garantia obtida com a proteção ao conhecimento por meio do sistema de
patenteamento passa a ter uma enorme importância na estratégia concorrencial
das empresas (MATIAS-PEREIRA et al., 2006; MATIAS-PEREIRA, 2011).
A mudança técnica é um fator essencial na
estruturação dos padrões de transformação da economia. Verifica-se, entretanto, que
a tecnologia não é um bem livre, visto que sua apropriação decorre do nível
acumulado de conhecimento, dos processos passados de aprendizado, das
experiências das empresas e do próprio meio institucional, que pode ou não
funcionar como um elemento redutor da incerteza das decisões de investimento em
novos processos ou produtos (FREEMAN; PEREZ, 1988). Deve-se considerar, ainda,
que os distintos segmentos industriais se diferenciam em termos de sua
capacidade de promover difusão tecnológica. Assim, o avanço do progresso
tecnológico repercute positivamente no processo de crescimento econômico.
Observa-se que o debate da função do sistema de
patentes não é uma coisa nova (PENROSE, 1951). O que fica evidente nesse debate, na atualidade, é a elevada
prioridade conferida ao sistema de proteção aos direitos de propriedade
intelectual por todos os países, em especial ao sistema de patenteamento, tanto
em nível interno como em nível internacional.
A tecnologia é um fator preponderante na
determinação das vantagens comparativas dos países no comércio mundial. O que não é uma
proposição nova. A teoria do hiato tecnológico (POSNER, 1961) e a do ciclo do
produto (VERNON, 1966, 1970) já apontavam a forma de difusão do progresso
tecnológico como um dos fatores subjacentes ao padrão e à dinâmica do comércio
internacional. A diferença é que, na nova etapa tecnológica, o principal fator
de produção é o conhecimento ou a informação (BIFANI, 1989). Neste sentido,
cresce o valor econômico do conteúdo de conhecimento embutido em novos
processos ou produtos. E, logo, aumenta também a relevância da propriedade
industrial sob dois aspectos. Primeiro, porque essa permite a proteção privada
do novo conhecimento. E, segundo, porque confere a possibilidade de extrair
rendas através da propriedade dos novos conhecimentos.
Deve-se ressaltar que nem toda patente corresponde
a uma invenção. Na verdade,
uma grande parcela de
patentes decorre de pequenas inovações realizadas em equipamentos e processos
existentes (KIM, 1997).
Indicadores de ciência, tecnologia
e inovação do Brasil
Torna-se possível argumentar que o Brasil
encontra-se numa posição intermediária entre os países que buscam colocar a
produção de conhecimento no centro do desenvolvimento econômico e social. Os recursos aplicados em ciência, pesquisa e fomento tecnológico representam 1%
do PIB, média semelhante à de nações como a Espanha (0,94%), mas muito distante
das maiores economias, como os Estados Unidos (2,7%) e Japão (3%), ou dos
tigres asiáticos, como a Coréia do Sul (2,5%). Nesses países, por outro lado, a
iniciativa privada, em especial a indústria, responde por 63% dos investimentos
em pesquisa e tecnologia, enquanto nas nações intermediárias o governo assume
cerca de 60% dessas inversões no setor. Dos investimentos aplicados em P&D
no Brasil (Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento, 2005),
o setor público foi responsável por 63%, enquanto os restantes 37% ficaram por
conta do setor privado. Os investimentos feitos em P&D naquele ano chegaram
a 1,07% do PIB brasileiro. A taxa histórica dos dispêndios governamentais em
P&D no Brasil é de 0,8% do PIB (BRASIL/ MDIC, 2004b).
Propriedade intelectual e registro
de patentes no mundo
Observa-se que a propriedade intelectual alcançou
sua atual importância em decorrência das inúmeras e sistemáticas evoluções em
seus conceitos. As mudanças
de paradigmas no mundo, gerando um nível maior de
interdependência entre os Estados-nação criou a necessidade de mais coordenação
entre elas (KEOHANE, 1984; MATIAS-PEREIRA, 2011). Nesse debate a propriedade intelectual pode
ser compreendida como o direito de pessoa, física ou jurídica, sobre um bem
incorpóreo móvel (DI BLASI, 2005).
Entre os fatores que têm atribuído maior valor à
propriedade intelectual destacam-se: sua visibilidade política, devido à grande
importância econômica para os países; e a constatação de que os bens imateriais
superaram a tradicional estimativa concedida aos bens materiais e imóveis. Verifica-se, dessa forma, que
os bens intangíveis de uma indústria, em geral, são mais valiosos que o
conjunto de seus ativos materiais. Essa realidade foi a responsável pela
acelerada evolução do sistema de registro de patentes no mundo, conforme se
pode verificar na discussão a seguir.
A Organização Mundial de Propriedade Intelectual
(WIPO, 2011b) define a patente como um documento expedido por um órgão
governamental, que descreve a invenção e cria uma situação legal, na qual a
invenção patenteada pode normalmente ser explorada (fabricada, importada,
vendida e usada) com autorização do titular. Nesse sentido,
o requisito de patenteabilidade se apresenta como a
principal característica do documento de patente. Isso significa que pode ser
patenteável a invenção que atenda aos requisitos de novidade, ou seja, aquilo
que não tenha sido divulgado antes. Parte-se do entendimento de que ela seja
inédita: que ainda não tenha existido, que possua atividade inventiva e
aplicação industrial, tornando-se passível, portanto, de ser comercializada.
Uma invenção pode ser considerada nova quando não está inserida no estado da
técnica, e este é constituído por todo o registro de acesso público antes da
data de depósito do pedido de patente, por descrição escrita ou oral, por uso
ou qualquer outro meio, no país de origem ou no exterior.
Ranking de registro de patentes no
USPTO e no PCT/WIPO
Observa-se que a capacidade de patenteamento dos
países, na atualidade, tem uma forte correlação com seu nível de
desenvolvimento. Embora os dados divulgados
pelo escritório norte-americano de patentes - United States Patent and
Trademark Office (USPTO, 2005), no período de 1980-2004 - mostrem que ocorreu
uma queda no crescimento do número de patentes concedidas nos países do G7
(EUA, Inglaterra, França, Alemanha, Itália, Canadá e Japão), a diferença em
termos de patenteamento quando comparados ao resto do mundo ainda é muito
grande. Em 2007 foram feitos 214.807 pedidos estrangeiros de patentes
depositados no Escritório de Marcas e Patentes do Departamento de Comércio dos
Estados Unidos (USPTO, 2007).
Os países em
desenvolvimento estão em ascensão nessas estatísticas de patenteamento do USPTO
(2005). Nesses dados podemos verificar que países emergentes, como Taiwan e
Coréia do Sul, em 2004, que na década de 1980 não tinham nenhuma expressão,
apareciam como grandes patenteadores mundiais, ocupando o 4º e o 5º lugares no
ranking da USPTO. No período de 2005-07 o Brasil teve 288 patentes concedidas
no USPTO (2007),4 contra
359 para a Malásia, 1.410 para a Índia e 2.775 para a China.
Esse baixo desempenho do Brasil em termos de
patenteamento revela-se bastante preocupante, considerando o tamanho e a
complexidade da economia brasileira.5 O ranking de registro de patentes do Patent Cooperation Treaty (PCT), acordo ligado à World Intellectual
Property Organization (Wipo),
que possibilita registro de patentes em 123 diferentes países, também é aceito
como um importante indicador do desempenho na área de inovação tecnológica de
um país.
Recorde-se que o PCT facilita as solicitações no
exterior ao permitir que elas cheguem a vários países a partir do primeiro
depósito no Brasil. Nesse ranking em 2005 (Brasil, 2007), os Estados Unidos ocupavam o
primeiro lugar, com 45.452 pedidos de patentes (33,8% do total), seguidos por
Japão (24.800 pedidos, ou 18,4% do total) e Alemanha (15.981 pedidos,
representando 11,9% do total). Entre os países emergentes, a Coréia do Sul
ocupava em 2005 a primeira posição, com 4.422 pedidos de patentes. O Brasil
aparece no ranking com 275 pedidos de patentes (na sexta posição entre os
emergentes), atrás da China (2.501), Índia (675), Cingapura (441) e África do
Sul (360), e à frente do México (140). Veja portal da Wipo: <www.wipo.org>.
No âmbito mundial, conforme destaca o relatório da
Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI), de 2009 (dados de 2007),
a concessão de patentes cresceu a uma taxa de 1,6%. O número total de patentes concedidas e
válidas no mundo naquele ano era de 6.3 milhões, e 4.2 milhões eram o número de
patentes depositadas (JUNGMANN, 2010).
O Brasil, em 2009, com o registro de 493 patentes,
apresentou crescimento de 1,6% nos pedidos de patentes no sistema
internacional. Em 2010 o país teve uma queda nesse ranking, com
487 patentes registradas (WIPO, 2011a). O país manteve sua tendência de alta,
destoando da média internacional, que registrou queda de 4,5% no ano passado. O
Brasil, no rol dos países em desenvolvimento, aparece como o quinto país com
maior número de pedidos, atrás de Coréia do Sul (8,066), China (7,946), Índia
(761) e Cingapura (594). Registre-se que a queda nos pedidos internacionais em
2009 foi mais forte nos países desenvolvidos. A redução foi de 11,4% nos
Estados Unidos, 11,2% na Alemanha, 3,5% no Reino Unido, 1,6% na Suíça, 11,3% na
Suécia, 5,8% na Itália, 11,7% no Canadá, 2,2% na Finlândia, 7,5% na Austrália e
17,2% em Israel.
Essa posição desconfortável do Brasil nos rankings
do USPTO e do Wipo/ PCT tem sido objeto de diversos
estudos no sentido de compreender por que o Brasil possui um nível de
desempenho tão medíocre em pedidos de registro de patentes no mundo. Uma das explicações para
o baixo desempenho do Brasil nos principais rankings de pedidos de registro de
patentes no mundo (USPTO; Wipo/PCT) estaria relacionada à baixa proporção de
pesquisadores que estão atuando nas empresas. Nos países desenvolvidos, até 80%
dos pesquisadores e seus estudos estão localizados nas empresas, enquanto os
restantes 20% se encontram na academia. No Brasil esta situação é praticamente inversa.
Observa-se, com base nos referenciais
internacionais, que o Brasil possui uma base de pesquisa acadêmica competitiva
(BRASIL/MDIC, 2004b). A base de pesquisa empresarial, entretanto, é bastante frágil. Dessa
forma, o grande obstáculo a ser superado é a implementação adequada das
políticas públicas orientadas para gerar estímulos para que as empresas do
Brasil possam empregar cientistas e engenheiros para fazer desenvolvimento
tecnológico nas empresas.
Políticas públicas de proteção à
propriedade intelectual
Na medida em que as políticas e gestão de ciência e
tecnologia estão a cargo do setor público, é perceptível que a avaliação da
qualidade das instituições voltadas à gestão e à formulação de política
científica e tecnológica encontra resistências.6 Observa-se que o Brasil ainda não conseguiu
desenvolver um sistema de administração pública de gestão do sistema de
propriedade intelectual compatível com as exigências das demandas num mundo
globalizado. Registre-se que, no Brasil,
as modalidades de proteção a propriedade intelectual está dividida em três
ramos de direitos específicos, o direito autoral, propriedade industrial e
proteção sui generis. O direito autoral, que abrange o direito de autor;
os direitos conexos; e, programa de computador. A propriedade industrial, que
cuida de marca; patente; desenho industrial, indicação geográfica e segredo
industrial e repressão à concorrência desleal. A proteção sui generis, que
trata de topografia de circuito integrado, cultivar e conhecimento tradicional.
Veja a figura 1, apresentada a seguir.
A questão da proteção à propriedade intelectual se
apresenta como uma área sensível e importante para apoiar o processo de
desenvolvimento do país (ORGANIZAÇÃO..., 2003). É nesse setor que estão ocorrendo, na atualidade, os maiores
enfrentamentos no mundo, visto tratar-se do controle de dois fatores
estratégicos para qualquer país: o domínio da tecnologia e da informação
proprietária. São os denominados ativos intangíveis - apropriados sob a forma
de títulos -, responsáveis pela geração de royalties, por meio da exploração de
marcas e patentes, ecopyright, pela reprodução de obras artísticas e
literárias (MATIAS-PEREIRA; KRUGLIANSKAS, 2005).
É oportuno ressaltar que a propriedade intelectual
compreende todas as regras relativas à proteção dos direitos de propriedade
industrial, os direitos de autor e do savoir-faire. Nesse sentido, a patente
de invenção, além de estimular a atividade inventiva e facilitar o intercâmbio
de conhecimento, também desempenha um papel importante na circulação de
informações científicas e técnicas e contribui, assim, para o enriquecimento do
patrimônio tecnológico da sociedade (CHAVANNE; BURST, 1993). A propriedade
industrial pode ser aceita como um instrumento legal que estimula uma maior
competitividade entre indivíduos ou empresas e promove a concorrência e o
avanço tecnológico. Assim, a propriedade industrial é importante para o
equilíbrio das relações entre indústrias, na medida em que define mecanismos de
colaboração entre estas e com universidades, institutos de pesquisas e outras
entidades congêneres.
Considerando que o desenvolvimento de novos
produtos e processos, em sua maioria, necessita de elevados investimentos, a
proteção por meio da propriedade industrial passou a ter cada vez mais
importância no cenário internacional, visto que se tornou um fator crítico de
vantagem competitiva para o país. Assim, as patentes
se tornaram essenciais para garantir o “market share” de empresas que se
propõem a crescer de forma sustentável e competitiva. A proteção patentária
permite que a empresas passem a dispor de mais tempo para desenvolver e
aperfeiçoar suas invenções, resultando em melhores produtos, processos e
serviços para o consumidor. A patente, por sua vez, é um privilégio legal
concedido pelo Estado aos inventores e a outras pessoas detentoras dos direitos
de exploração de um produto, de um novo processo de fabricação ou de um
aperfeiçoamento de produto ou processo existente. A carta patente é uma
instituição econômica e jurídica que: define a propriedade tecnológica; garante
o mercado para seu titular, por prazo determinado; incentiva e obriga a
sociedade em geral a uma contínua renovação tecnológica.
Veja a esse respeito o quadro síntese, apresentado
a seguir, que descreve as características do registro e a obtenção de patente
no Brasil.
Quadro síntese: Registro e
obtenção de patente no Brasil
Título concedido |
Carta Patente |
Objeto da
proteção |
Invenção ou
modelo de utilidade que envolve novos produtos e/ou processos com aplicabilidade
industrial. |
Legislação
aplicável |
Lei da
Propriedade Industrial (LPI), nº 9.279/1996. |
Requisitos |
• Novidade • Atividade
inventiva* • Aplicação
industrial* |
Direito
assegurado ao titular |
Exclusividade de
produzir, usar, vender e exportar no país onde a proteção foi concedida. |
Prazo de
validade |
• Patente de
invenção: 20 anos, contados da data do pedido de depósito • Modelo de
utilidade: 15 anos, contados da data do pedido de depósito |
Órgão
responsável no Brasil |
INPI – Instituto
Nacional da Propriedade Industrial (www.inpi.gov.br) |
Fonte:
Matias-Pereira (2011), com adaptações.
* Requisitos utilizados para modelo de
utilidade.
Processo de modernização do
Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI)
Observa-se que o processo de globalização está
afetando duramente o sistema de patentes na maioria dos países no mundo. Essa crise instalada no
sistema de patentes mundial também está se refletindo no Brasil, nos aspectos
qualitativos e quantitativos. Nos aspectos qualitativos verifica-se a crescente
intenção de patentear descobertas e não invenções; as interpretações
distorcidas dos conceitos de utilidade e não obviedade etc. Quanto aos aspectos
quantitativos, verifica-se nas últimas duas décadas uma elevação significativa
do número de pedidos de patentes depositadas; a entrada no sistema de
propriedade intelectual de novas áreas de patenteabilidade, como biotecnologia,
nanotecnologia, informática; o crescimento da complexidade dos pedidos de
patente; o maior número de países em que um mesmo pedido é depositado, entre
outras. Isto tem refletido sobre a qualidade dos serviços prestados pelos
órgãos encarregados de registrar as patentes (ÁVILA, 2007). Demora na análise
dos pedidos, elevação do custo de patenteamento e expedição de patentes
duvidosas. Esses problemas assinalados podem ser visualizados nos relatórios de
desempenho do Inpi, divulgados no período de 1999 a 2009 (BRASIL/INPI, 2009).
Diante desse contexto, ganhou relevância a
necessidade do fortalecimento das políticas de desenvolvimento e inserção internacional
do Brasil. Esse cenário levou o
governo federal a dar início à implementação de um programa de reestruturação
do Inpi em 2004, logo após a implantação da Política Industrial, Tecnológica e
de Comércio Exterior (Pitce). O objetivo do programa foi dividido em duas
fases: busca da eficiência e para a facilitação do acesso dos cidadãos e
empresas aos serviços prestados, além do desenvolvimento de uma cultura de
propriedade intelectual que favorecesse o crescimento e a inserção
internacional das empresas brasileiras na economia global (BRASIL, 2009:9).
2. papel do Inpi
O Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi),7 autarquia federal vinculada ao Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), é o órgão responsável no
Brasil por executar as normas que regulam a propriedade industrial, levando em
consideração sua função social, econômica, jurídica e técnica. Dentro dessas atribuições,
estão incluídas tarefas como a concessão de registros
de marcas e patentes. Dessa forma, o Inpi é o único órgão no âmbito nacional
responsável pelo registro de patentes de inovações tecnológicas.
O Inpi, em relação a suas
metas de disseminação e apoio ao desenvolvimento, tem a responsabilidade de
buscar ampliar o depósito de patentes de invenções e desenhos industriais por
empresas e universidades brasileiras; ampliar o uso do PCT por brasileiros;
ampliar o depósito de marcas e desenhos industriais brasileiros no exterior; e
criar indicações geográficas brasileiras.
Registre-se que o Inpi é
o responsável pelo Programa 0393 - Desenvolvimento do Sistema de Propriedade
Intelectual do Plano Plurianual (PPA) no âmbito do governo federal. O objetivo do programa
é promover o uso estratégico e reduzir a vulnerabilidade do sistema de
propriedade intelectual de modo a criar um ambiente de negócios que estimule a
inovação e promova o crescimento e o aumento da competitividade das empresas e
favoreça o desenvolvimento tecnológico, econômico e social. O público-alvo do
referido programa é formado por pessoas físicas e jurídicas nacionais e
estrangeiras que podem ser beneficiadas pelo registro, proteção, uso e
comercialização de propriedade intelectual em território brasileiro. A
propriedade intelectual é responsável, na atualidade, pela maior parte do valor
gerado pelas empresas modernas, especialmente nos segmentos mais dinâmicos,
aqueles referentes a produtos diferenciados por marcas e outros signos distintivos, design e
conteúdo tecnológico ou autoral (BRASIL/INPI, 2009).
Para o Inpi (BRASIL/INPI,
2009), a adequada administração dos sistemas de propriedade industrial, dos
direitos de autor e conexos (relativos ao software e às indústrias
criativas em geral) e das demais formas de propriedade intelectual é
fundamental para incentivar o investimento em pesquisa e desenvolvimento e nas
atividades criativas em geral; tornar viável a cooperação tecnológica entre
diferentes empresas e entre empresas e instituições de pesquisa; proporcionar o
acesso das empresas brasileiras ao sistema de propriedade intelectual, criando
condições para que estas venham a desenvolver, adquirir e comercializar
tecnologia e outros ativos de propriedade intelectual e a obter, assim, um nível
de inserção na economia internacional superior ao que se pode obter nos
mercados de commodities; evitar que se cometam equívocos na concessão
de direitos, que venham a minar a previsibilidade e, portanto, não incentivem
investimentos em inovação e marketing, assim como onerem indevidamente os
consumidores; e promover a circulação da informação e do conhecimento
necessário para o desenvolvimento das empresas.
Síntese das principais ações
desenvolvidas pelo Inpi - 2007-10
O Inpi alcançou, conforme
delineado no Relatório de Gestão de 2009, metas importantes na área de
propriedade intelectual, com destaque para: a consolidação do sistema de
processamento de marcas e a estruturação dos serviços de exame internacional de
patentes, no âmbito do Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes (PCT, na
sigla em inglês); a aprovação pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento
(BID) do projeto de integração de escritórios de propriedade intelectual de
oito países sul-americanos, para estabelecer uma plataforma cooperativa para o
exame de marcas e patentes; a contratação de novos examinadores de patentes e
de pesquisadores seniores que se dedicarão às atividades de pesquisa e ensino
de pós-graduação; e a ampla disseminação da importância da propriedade
intelectual para instituições de pesquisa e empresas brasileiras de diferentes
portes e setores de atividade.
Verifica-se que em 2008 foram depositados no INPI
14.741 pedidos de patentes, sendo que destes, mais de 50 % (7.499) são de
inventores não residentes no país. Neste mesmo
ano foram expedidas 529
cartas patentes a inventores residentes no Brasil, enquanto que para os não
residentes foram expedidas 2.249 cartas patentes. No mesmo ano, o Brasil
depositou 499 pedidos de patentes nos Estados Unidos e obteve a concessão de
131 cartas patentes neste país (BRASIL/MCT, 2010).
Evidencia-se, em relação à produtividade e
informatização em patentes, que o Inpi (BRASIL/INPI,
2009) vem ampliando sua produtividade. As patentes concedidas
cresceram 52% de 2007 para 2008, subindo de 1.855
para 2.824. Em 2009, acréscimo de mais 11%, chegando a 3.153, e, em 2010, o
índice foi de 3.620. O crescimento da capacidade do Inpi é necessário para
atender à ampliação da demanda por patentes, tanto por brasileiros quanto por
estrangeiros; prova disso é que os pedidos passaram de 23.221 para 26.232 -
acréscimo de 12,9% entre 2007 e 2008. A estimativa para 2010 é de 30 mil novos
pedidos. O Inpi investe, desde 2008, na adaptação para o Brasil do sistema
Eptos, desenvolvido originalmente pelo Escritório Europeu de Patentes (EPO). O
sistema compreende um conjunto de ferramentas de automação para gestão dos
procedimentos num órgão de propriedade industrial, incluindo o depósito
eletrônico e o processamento dos pedidos. Isso resultará na realização de todo
o andamento do pedido pela internet, incluindo aspectos legais. Em dezembro de
2010, teve início a implantação do sistema de exame eletrônico de patentes, com
os examinadores trabalhando com todos os documentos digitalizados. A próxima
etapa, de implantação do controle eletrônico do fluxo de trabalho, será
acompanhada de nova organização dos procedimentos de exame, com otimização e
aumento da produtividade.
Observa-se que o Inpi
(BRASIL/INPI, 2011), em busca de agilidade nas análises de patentes, vem
desenvolvendo diversas ações, com destaque para a busca de parcerias com outros
institutos nacionais de propriedade industrial. É o caso, por
exemplo, do Patent Prosecution Highway (PPH), que está sendo discutido pelo
Inpi com os Estados Unidos, México, Portugal, Espanha e Japão. O PPH
permite realizar o trabalho em menor tempo, visto que o examinador de um país
pode ter acesso à busca internacional que foi feita pelo pesquisador de outra
nação, servindo como subsídio para seu trabalho. Todos os
examinadores devem fazer a
mesma busca, já que uma patente só pode ser concedida se não houver nada igual
ou muito semelhante em nenhuma parte do mundo. Registre-se, ainda, que o
segundo país não precisará analisar as reivindicações que já tiverem sido
indeferidas no primeiro, e que o pedido somente será analisado pelo PPH a
partir da solicitação do requerente.
Outro avanço relevante no esforço de modernização
do Inpi é o lançamento do sistema de aquisição de
dados PCT (Sisad-PCT), que permitirá o cadastro mais
rápido dos pedidos de patentes que chegam ao instituto a partir do exterior,
via Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes (PCT), o que contribuirá para
acelerar o processo. Trata-se de um sistema que possibilita a aquisição automática de dados com
o acesso a todas as informações de um pedido PCT, através da comunicação com a
base de dados da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (Ompi). Veja
portal do Inpi: <www.inpi.gov.br>.
Principais ações para a aceleração
das atividades do Inpi
A análise do planejamento estratégico do Inpi (BRASIL/INPI, 2011) indica que a próxima etapa de
desenvolvimento do instituto e do sistema brasileiro de propriedade industrial
(ou de propriedade intelectual de interesse da indústria brasileira) será
caracterizada pela consolidação dos resultados alcançados nos últimos anos e
pelo avanço das reformas estruturais. Essas iniciativas
têm por objetivos a
eficiência e a qualidade nos exames e a promoção do uso estratégico da propriedade
industrial por brasileiros e residentes no Brasil. A etapa 2011/2014 também
deverá ser marcada pelo aprofundamento da inserção internacional do Inpi, com
ênfases na colaboração e integração regional (entre Inpis e afins) e no
desempenho de papéis de maior relevância no contexto multilateral global.
Conforme vislumbrado no planejamento estratégico em
elaboração, a ação futura poderá ser organizada em quatro dimensões principais:
eficiência e qualidade operacional; promoção do uso estratégico da propriedade
intelectual (PI) por brasileiros e residentes; integração regional; e
aperfeiçoamento do sistema global de PI e reposicionamento do Inpi. A etapa
2011/2014 também deverá ser marcada pelo
aprofundamento da inserção internacional do Inpi, com ênfases na colaboração e
integração regional (entre Inpis e afins) e no desempenho de papéis de maior
relevância no contexto multilateral global.
Percepção dos empresários sobre
inovação e propriedade intelectual: análise dos resultados da pesquisa
qualitativa
Tendo como objetivo identificar as principais
características e fragilidades da gestão das políticas públicas na área de
proteção à propriedade industrial, em particular sobre patenteamento foram
feitas 33 entrevistas qualitativas com dirigentes de empresas industriais de
grande, médio e pequeno porte, todas localizadas no estado de São Paulo. As entrevistas foram
realizadas nos meses de outubro e novembro de 2010.
Apesar de tratar-se de uma amostragem limitada, somente nas empresas de grande
porte se observou que existe uma consciência da importância da inovação,
traduzida tanto pelo patenteamento de suas invenções como pela vigilância sobre
o mercado em termos de privilégios patenteados por terceiros. Registre-se que
as entrevistas foram realizadas por meio da internet. A pergunta formulada foi:
qual a percepção sobre a importância e o nível de prioridade dada por sua
empresa para a questão do patenteamento? Os informantes discorreram livremente
sobre o assunto em pauta. O tratamento dos dados obedeceu aos seguintes passos:
ordenação e classificação dos dados e análise final. Os resultados obtidos na
pesquisa qualitativa são importantes para reforçar as nossas conclusões sobre o
nível de conhecimento da indústria acerca das questões envolvendo a gestão da proteção
da propriedade industrial e as dificuldades e problemas enfrentados nesta área.8
O que se destaca das entrevistas
qualitativas
i. A propriedade industrial
- área do direito identificada como "marcas e patentes" - é aceita
por unanimidade dos entrevistados como uma área importante para as atividades
industriais e empresariais dos mais diversos setores. Apesar de valorizada e
utilizada como instrumento de estratégia concorrencial e de competitividade nos
países mais desenvolvidos, afirmam os entrevistados que o sistema de
propriedade industrial é subutilizado e desconhecido por substancial parcela do
empresariado.
ii. A falta de
proteção adequada de marcas, patentes e desenhos industriais, tanto no Brasil
como no exterior, é vista por todos os entrevistados como bastante prejudicial
à competitividade da indústria brasileira. Isso tende a dificultar ou impedir a
recuperação de investimentos em pesquisa e desenvolvimento e pode ser causa de
vultosos prejuízos, perda de clientela e de oportunidades comerciais.
iii. As empresas e
instituições nacionais, em geral, parecem não estar adequadamente atentas para
as fortes mudanças ocorridas no cenário mundial, com profundo impacto sobre o
comércio, bem como no acesso às tecnologias, onde a propriedade intelectual tem
sido objeto de importância crucial na competitividade. Fica evidenciado nas
entrevistas que, apesar de o mercado externo ser muito visado pela indústria,
não há uma preocupação acentuada com a proteção da propriedade industrial no
exterior. Isso tem criado entraves para colocação de produtos brasileiros em
outros mercados.
iv. Todos os
entrevistados sustentam a importância de o Estado orientar as políticas
públicas na área de propriedade industrial, principalmente no que se refere à
reestruturação e fortalecimento do Inpi, com vista a tornar mais eficiente a
administração do sistema público de proteção da propriedade industrial no
Brasil.
v. Os entrevistados
sustentam a importância da realização de estudos consistentes pelo segmento
empresarial, em parceria com o Inpi, com vista a disponibilizar informações
sobre a matéria propriedade industrial, para subsidiar o governo e o setor
produtivo.
vi. As empresas, no
que se refere à inovação tecnológica, necessitam rever padrões de
comportamentos, como adoção de decisões que buscam resultados imediatos,
aversão ao risco e egoísmo colaborativo.
vii. É preciso que
empresas priorizem, em suas estruturas organizacionais, definições políticas ou
diretrizes e suporte para a gestão das ações de Propriedade
Intelectual/Patentes. Para isso, é preciso que as empresas adotem políticas
mais agressivas, no que se refere ao uso do Sistema de Patentes como proteção legal,
bem como fonte de informação tecnológica e de mercado.
viii. Para uma grande
parcela dos entrevistados (especialmente os professores pesquisadores) é
importante intensificar as ações para estimular as instituições tecnológicas,
de pesquisa e universidades a fortalecerem seus núcleos de gestão de
tecnologia/patentes. É preciso, também, disseminarem a cultura da propriedade
intelectual e utilizarem indicadores de desempenho que privilegiem o
desenvolvimento de novos produtos e processos, e a parceria com indústrias como
forma de incrementar as inovações.
Visão da indústria sobre a gestão
de políticas de propriedade intelectual
A percepção de inúmeros empresários e especialistas
sobre a gestão de políticas de propriedade intelectual no Brasil, contidas nas
conclusões do Congresso Brasileiro de Inovação na Indústria (CONFEDERAÇÃO
NACIONAL DA INDÚSTRIA, 2005b), respalda as constatações feitas pela pesquisa
qualitativa deste artigo. A síntese
do documento assinala que:
As condições de operação do INPI constituem um
óbice às empresas que pretendam estabelecer uma adequada gestão da sua
propriedade intelectual. O tempo médio
de 9 anos para a obtenção de uma patente e de 5,5 anos para a concessão de
marca é um indicativo claro das dificuldades atualmente observadas. A isso se
soma também o custo do registro de patentes, que é elevado para as pequenas
empresas e que requer a contratação de assessoria jurídica especializada. O
INPI possui poucos funcionários e ainda opera com níveis de informatização
insuficientes. Por outro lado, há a necessidade de uma maior disseminação da
cultura de proteção da propriedade intelectual entre as empresas e as
instituições de ensino e pesquisa, o que tem levado em muitos casos a uma
proteção inadequada dos conhecimentos gerados.
3. Conclusões
As deficiências evidenciadas na avaliação do
desempenho da gestão do sistema de proteção à propriedade intelectual no país
ainda são preocupantes. Essa análise
revelou que, entre outras
deficiências, existem dificuldades na administração dessas políticas, em
particular, no segmento de registro de patentes. Constata-se, assim, que
políticas públicas orientadas para a área de propriedade intelectual não estão
cumprindo adequadamente seu papel, em termos institucionais e de geração de
estímulos à inovação. As pressões da sociedade organizada exigindo o
aprofundamento nas mudanças, o redimensionamento e o fortalecimento do Inpi
para estimular a incorporação tecnológica na produção e a inovação - que se
apresenta como o principal foco da política industrial - dão respaldo parcial a
esta afirmação.
Ficou razoavelmente evidenciado que, na busca de
fomentar a C,T&I no Brasil, tanto a Lei de Inovação como as Diretrizes da
Política Industrial e Tecnológica, o Plano de Ação de Ciência, Tecnologia e
Inovação para o Desenvolvimento Nacional – 2007/2010 e a Política de
Desenvolvimento Produtivo fazem parte de um ciclo, que partiu da discussão
focada nos recursos, atingiu os aspectos institucionais, que agora precisam ser
implementados. Observa-se, após a regulamentação
da Lei de Inovação, que ainda existem aspectos que necessitam um maior
detalhamento, de forma a preservar a identidade tanto das universidades quanto
das indústrias e empresas, para que, de fato, ela possa vir a se tornar um
instrumento relevante de fomento à política industrial e tecnológica do país.
É inegável que a dinamização do uso da propriedade
intelectual precisa de suporte e estímulos institucionais. As políticas públicas
de proteção à propriedade intelectual se fazem necessárias, especialmente para
as universidades e os centros de pesquisas e para as indústrias, visto que
nesse campo ocorre grande parte da criação e inovação tecnológica e cultural, a
partir de teses, conceitos e teorias potencialmente geradores de tecnologias
inovadoras. A geração de estímulos e de parcerias para fomentar as ações
conjuntas entre as universidades e os centros de pesquisa e o segmento
industrial é essencial para facilitar o intercâmbio de informações específicas
para agilizar os processos de pedidos de patente e a definição dos parâmetros
de comercialização e transferência de tecnologia.
O baixo nível de conhecimento e interesse dos
dirigentes de grande parcela das empresas brasileiras no campo da propriedade
intelectual vem gerando riscos desnecessários nas exportações de seus produtos.
Diante das deficiências e fragilidade do sistema de
gestão de políticas de proteção à propriedade intelectual, argumentamos que é
essencial que o país continue se modernizando nessa área, em particular no
segmento de registro de marcas e patentes. Torna-se essencial que o país
intensifique a utilização da proteção à propriedade intelectual como um
instrumento de suporte ao processo de desenvolvimento socioeconômico. Essas
mudanças devem ser implantadas, necessariamente, por meio da gestão de
políticas públicas consistentes.
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Acesso em 12 dez. 2011.
Notas
1 Registre-se
que a versão em português do citado relatório inclui o capítulo 1 sobre o
crescente papel do conhecimento na economia global e o capítulo 5 sobre o
Brasil. Veja o relatório completo em: <www.unesco.org/science/psd>.
2 Lei
do Bem (Lei nº 11.196/2005 - Decreto nº 5.798/2006). A Lei do Bem institui o
Regime Especial de Tributação para a Plataforma de Exportação de Serviços de
Tecnologia da Informação (Repes), o Regime Especial de Aquisição de Bens de
Capital para Empresas Exportadoras (Recap) e o Programa de Inclusão Digital. A
citada Lei do Bem, além de dispor sobre incentivos fiscais para a inovação
tecnológica, cuida ainda de outras questões tributárias, instituindo até mesmo
outros regimes especiais de tributação. No tocante aos incentivos à inovação,
coube à Lei nº 11.196/2005 dar cumprimento à determinação da Lei nº 10.973, de
dezembro de 2004.
3 A
Classificação Internacional de Patentes teve suas primeiras discussões no
início dos anos 1920. O texto da primeira edição da CIP foi estabelecido de
acordo com a convenção européia para a classificação internacional de patentes
em 1954. A primeira edição é datada de 1969. A classificação é periodicamente
revisada a partir de reuniões de peritos dos países-membros da Organização
Mundial da Propriedade Intelectual (Ompi). Essa classificação pode ser acessada
nos sites do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) e da Ompi.
Veja portal do Inpi: <www.inpi.gov.br>.
4
O registro de patentes brasileiras no USPTO caiu 13% no triênio 2005-07 em
comparação com o triênio 2002-04, período no qual o Brasil obteve o registro de
332 patentes. Veja portal da USPTO: <http://patents.uspto.gov>.
5
O Brasil encerrou o ano de 2008 com um saldo de apenas 90 patentes concedidas
nos EUA, contra 1.121 para a China, 545 para a Índia e 158 para a Malásia. Isso
explica a queda do país para o 29º lugar na lista geral do USPTO. Deve-se
destacar, também, que o depósito de patentes dentro do Brasil é igualmente
reduzido. Em 2007, foram solicitadas, por todos os países, 24.107 patentes e
desenhos industriais, das quais foram concedidas apenas 1.855 (Brasil,
2009).
6 Observa-se
que a ciência, a tecnologia e a inovação no Brasil ainda não são tratadas como
questões de Estado, que devem ultrapassar os governos e devem ser tratadas como
compromissos que se transferem de um período governamental para outro
(Matias-Pereira, 2009).
7 O
Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) é responsável por registros
de marcas, concessão de patentes, averbação de contratos de transferência de
tecnologia e de franquia empresarial, e por registros de desenho industrial e
indicações geográficas, de acordo com a Lei da Propriedade Industrial (Lei nº
9.279/1996), além de registros de programas de computador (Decreto nº
2.556/1998) e de topografia de circuitos integrados (Lei nº 11.484/2007). Disponível
em: <www.inpi.gov.br>.
8 Foram
importantes para elevar o nível de consistência deste artigo às exposições dos
empresários, especialistas e pesquisadores que participaram do 6º Encontro
Nacional da Indústria - Enai 2011, realizado em São Paulo, nos dias 26 e 27 de
outubro de 2011. O evento teve como tema central o fortalecimento da competitividade da indústria brasileira. Por
meio de palestras, debates e sessões plenárias foram abordadas as grandes
questões nacionais no contexto econômico, social e político, que influenciam a
competitividade da indústria e a inserção do Brasil no mercado globalizado (disponível
em <www.cni.org.br>.
Devemos destacar, também, as contribuições dos expositores da XI Conferência
Anpei de Inovação Tecnológica, promovida pela Associação Nacional de Pesquisa,
Desenvolvimento e Engenharia das Empresas Inovadoras (Anpei), realizada entre
os dias 20 e 22 de junho de 2011, em Fortaleza (CE). O evento
focalizou as redes de inovação e cadeias produtivas (disponível em <www.anpei.org.br>).